Relato de uma alma perdida
Estou viva. Percebo, logo após constatar
que os remédios não fizeram o efeito desejado e ao contrário do que era
esperado, elas me colocaram (depois de quatro dolorosas tentativas) uma sonda
que vai até meu estômago. A luz branca invade meus olhos. Tento não pensar, não
sentir, mas é inevitável quando tudo em mim dói, confirmando que ainda estou
viva.
Tento respirar, mas tudo em mim dói. Vejo
minhas veias expelindo o soro e o sangue manchando minha pele. Dói. Mas esta é
uma dor irrelevante. Volto a repetir que estou viva. Ouço o médico e as
enfermeiras falarem palavras incompreensíveis aos meus ouvidos, mas no entanto,
eu respiro, com dificuldade e dor, confesso, porém, estou aqui.
De repente tudo se torna irrelevante. Os
amores, as grandes e pequenas vitórias, os amigos conquistados e aqueles que o
tempo levou. Penso em meus pais e sinto dor. Eu queria vê-los, aperta-lhes a
mão, pedir desculpas pelo transtorno, mas sinto que não posso fazer tal coisa
quando não há arrependimento. E não, querido leitor, apesar das dores sentidas
(que por sinal foram muitas), eu não me arrependo dos comprimidos tomados, dos
pensamentos alimentados, da morte que embora rápida, tenha acenado em minha
direção.
Vai passar. Eu irei embora, ainda que
dopada, e deitarei em minha cama. Talvez eu durma, talvez eu sonhe, talvez eu
acorde no meio da noite, talvez eu sinta saudade, talvez. O dia vai nascer. O
vazio vai anunciar sua existência e eu chorarei pelo que não aconteceu e pela
minha fraqueza. Chorarei de saudade. Chorarei pelas lembranças. Mas
continuarei, afinal, eu não morri.
Estou viva.
Eu respiro.
Mas estou oca.
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