O que as águas me deram


Por que começar seria algo assim tão difícil quando já se sabe o final? – Questionou-se deixando para trás uma folha que continhas apenas poucas linhas escritas. Não se submeteu a guardar aquele pedaço de papel, nem jogar fora aquelas tentativas frustradas de escrever. Ao contrário, preferiu deixar tudo ali, como se ainda fosse retornar aquele lugar.
Ergueu-se devagar e ainda sonolenta, e caminhou até o espelho. Sua fisionomia triste agora era refletida – Olhos fundos. Pele pálida. Lábios secos – Mas não tão seco quanto seu coração.
Queria então continuar a carta, mas não havia alguém que pudesse ler seus escritos. Um alguém que chorasse com o desespero que existia em suas letras tremulas, a rasgar o papel. Ali havia apenas a solidão, e está já conhecia bem suas amarguras. Foi então que desistiu de escrever.
O reflexo no espelho foi aos poucos dando lugar a um quarto de moveis antigos, com aparência triste, e recoberta pela escuridão. Ela agora caminhara em direção a porta de entrada, e dentro dela existia a certeza de que por aquela porta ela jamais voltaria a passar.
O vento soprava frio despenteando ainda mais aqueles negros cabelos, seus pés descalços tocavam com cuidado a terra úmida, enquanto seu corpo arrastava-se com cautela em direção a um rio com águas negras. Hesitou ao sentir o toque frio das pequenas ondas que tocavam sua pele, mas estas sussurraram-lhe para prosseguir. E aos poucos seu corpo pálido foi deixando-se tomar por uma nostalgia sombria, até que sua face mergulhou nas profundezas obscuras do lago, enquanto este prendia seu corpo nas águas, para a morte beijar seus lábios.


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