Prontos para partir


- Agora compreendo as lacunas em minha alma – Disse ela – compreendo cada uma, das tantas, que ao longo dos meus poucos anos de vida foram se formando, crescendo e intensificando ao ponto de não poderem mais se extinguir. Afinal, depois de tanta lágrima derramada, percebi que tudo que amei de certa forma nunca esteve de fato em minhas mãos. Eu amava o que não me pertencia, e que, portanto, mais cedo ou mais tarde causaria em mim profundas tristezas. – Admitiu entre suspiros.
- O problema não estar naqueles que você amou, mas sim na forma como permitiu que eles entrassem em sua vida. – Minhas palavras, ainda que seguras, eram temerosas, pois sabia que ao falar estava também quebrando algo de muito valioso. – Você diz que tudo amou de certa forma partiu. Eu acredito em você. Acredito na sua dor e no desespero que a toma, mas não prenda-se a isso. Não deixe que certos fatos destruam o que há de melhor em você. –
- Sim, talvez o problema não esteja nos que partiram, mas na inocente ideia de que eles permaneceriam ao meu lado nos instantes de caos, segurando firmemente minha mão. Eu realmente acreditava. – Pausa. – Assim como acreditei que o abandono a qual cresci ouvindo, poderia ser esquecido. Doce engano, hoje sei. Infelizmente minha vida está fadada a ver aqueles que amo entrarem em minha vida, desorganizar o que há de mais certo e partir, deixando para trás uma bagunça muitas vezes impossível de arrumar. Tudo bem! Todos dizem. Tudo bem chorar ou  sentir que as coisas não serão superadas. Tudo bem. Afinal, eles dizem que mais cedo ou mais tarde passará, e eu acredito, eu acredito mas temo, porque sei que aqui dentro nada mais será igual. E temo pelos estragos provocados por uma tempestade anunciada.

Eu não tinha mais o que dizer. Olhei e vi naquela mulher não seus traços físicos, mas dor. Ela toda era uma dolorosa e amarga mistura de agonia e lágrimas. Quis abraçá-la, mas senti que não deveria. Ela não iria mais acreditar. E eu temia por ela. 

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