A casa



A chave que seguro entre meus dedos parece mais fria que o proporcional a uma pequena e quase imperceptível, chave. Ela no entanto, está aqui, colada entre meus dedos, arraigada com firmeza, fazendo-me crer na necessidade de dá um passo adiante.
Sei que é preciso, não como todas as coisas pelas quais sonhei entre meus anos de devaneios e desistências. Há uma necessidade súbida em introduzir a maçaneta e girar a chave. É o que todos esperam de mim, mas não o que eu desejo, de fato.
Olho para os lados e penso no quão irreal seria correr por entre essas ruas vazias, tristes e ensolaradas. No meu cabelo cobrindo meus olhos e na respiração que logo tornaria-se ofegante. As pessoas me olhariam com estranheza ou talvez até parassem para me observar, incrédulas, expondo com espanto sua sanidade.
Mas eu não corro, não. Ainda há -por menor e mais ironico que seja- uma vesga de sanidade entre meus pensamentos perturbados e minhas vontades insanas. Ao invés de correr como tanto gostaria, giro com cuidado a chave e a porta se abre, quase que como mágica.
A luz é escassa, mas eu não me importo. Não quero uma visão total da minha mais nova e caótica realidade. Permito o escuro, o impalpável, o medo. Entro pisando leve, assustada, desejando que o universo inteiro se desfarça sob meus pés. Mas nada disso, de fato, acontece. Os cômodos são pequenos, mas estranhamente parecidos comigo. Não quero aceitar que a partir daquele momento é aqui, diante dessas brancas paredes que dividirei uma vida que, até segundos atrás, eu estava pensando em como desfazê-la. Não, em definitivo, pensar me traz um nó estranho na garganta e eu, não posso chorar na frente deles.

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