Prelúdio
Hoje não, mas amanhã prometo dá um jeito
nas gavetas, organizar os papeis, separar os livros didáticos dos literários e
jogar as amareladas cartas no fundo da lixeira, amanhã, sim? Amanhã eu prometo
que levanto bem cedo, antes mesmo do despertador e saio para caminhar, como há
meses eu deveria fazer. Amanhã, prometo que amanhã. Olha amanhã eu troco a mobília
de lugar, arrumo o guarda roupa e separo aquelas que não se servem mais, para
assim, doá-las num gesto corriqueiro de solidariedade. Amanhã.
Amanhã, eu te garanto que serei mais
paciente e não me afetarei tanto com as coisas pelas quais eu não consigo
mudar. Prometo que amanhã eu peço desculpas por não ter tido a paciência que
deveria ter, no dia anterior. Amanhã eu olharei com olhos de humanidade para o
mendigo que todos os dias, me cumprimenta, enquanto eu, apenas o ignoro. Amanhã eu sorrio, não, amanhã eu gargalho,
acho graça dessa gente estranha que acredita saber demais quando na verdade
tornam-se meros palhaços vivendo em um circo, socialmente perfeito. Amanhã eu
prometo rir deles.
Amanhã, sim, amanhã, eu tirarei os
originais do meu livro e com determinação, voltarei a escrevê-lo. Amanhã eu amarei sem medo de que o amor
seja a pior das mentiras. Amanhã serei a famosa escritora de um livro
complexo. Amanhã, beberei mais água, tomarei menos coca cola, ouvirei mais
Chico Buarque e dançarei entre os embalos da vida. Amanhã. Amanhã acreditarei
que dor alguma superará minha felicidade e que sou suficientemente forte pra
suportar o individualismo alheio. Amanhã, quem sabe, amanhã, eu acredite no
amor.
Hoje, no entanto, eu tomo um café.
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