Leia-me
Para ser lida ao som de
Chasing Cars
Há uma quantidade exorbitante de placas
penduradas por toda a cidade, você por acaso as percebeu? Será, que enquanto
distraidamente seus passos se faziam auditíveis, você ergueu seus olhos e as
leu?
Sinto-me
sozinha!
A primeira e não menos importante,
afinal, a solidão não passa de uma junção de doações. Doa-se atenção, carinho,
na empobrecida esperança de uma reciprocidade inexistente. Afinal, nem todos
sabem acalentar, estender a mão, tocar feridas. Ver o outro sangrando enquanto
sua vida está aparentemente razoável é para poucos, para os raros. E não falo
aqui somente de amizade, falo de humanidade, de pontos de socorro. Ter alguém para quem ligar quando tudo está
se esvaindo e não ter vergonha de chorar até o grito irromper o peito. Falo de
segurar na mão enquanto o outro dorme. Falo de permanecer. Da não solidão. Falo
de tudo aquilo que não acredito mais.
Eu
não sou forte!
Escondo-me na penumbra dos covardes e
entre sorrisos e acenos digo que tudo está bem, que vez ou outra, caio, mas
nada de tão grave. Minto sobre o buraco e sua profundidade. Eles acreditam. Eu
os engano. E assim passam-se os dias. Mas a questão é, até quando?
Faça-me
acreditar!
Quando criança tudo era motivo para uma
boa história. O senhor da esquina, a velha estranha da rua ao lado. Todos os
monstros que eu, forte e corajosa, conseguia derrotar. Cresci acreditando que a verdade prevalece, não importa quantos
monstros tenhamos que destruir no percurso. Eu estava errada. Aliás, eu estava
muito errada. Quando a primeira decepção veio, assustei-me, doeu, senti
algo muito pequeno e raro quebrar, quase pude ouvir, mas confesso que ignorei.
Afinal, ao crescermos percebemos que os
monstros da nossa infância não moram na rua ao lado nem se transformam com o
poder da lua, eles simplesmente dividem conosco as risadas e os dias de luz. Depois
veio a segunda, a terceira, a décima quarta e por Deus, eu já não contava mais.
Eram pequenas mentiras, grandes enganos, mãos que não seguravam, abraços frios,
sorrisos temporários. E assim ouvi aumentar o som dos cacos que se quebravam
dentro de mim. Eram muitos. Cada um representava aquilo que eu acreditava no
ser humano. Hoje, espalhados pelo chão, não sei se um dia conseguirei
junta-los. Não sei acreditar em um mundo
aonde partir está incluso no pacote. Quero acreditar. Quero muito
acreditar. Mas os cacos ainda provocam cortes profundos e a dor de senti-los
impede que meus pés caminhem além. Você entende?
Tire-me
do escuro!
Venha sem avisar. Apareça como quem não
quer nada, apenas ver-me. Sente-se. Beba um café, mas antes de ir, por favor,
abra o guarda roupa, olhe embaixo da cama, certifique-se de que eles foram
embora, ou ao menos que estão assustados demais para serem vistos. E então abrace-me
como se nossas almas fossem prolongar-se. Eles
se foram. Eles se foram e você pode finalmente dormir. Diga-me, por favor.
Embora eu saiba que os monstros, eles não estão embaixo da minha cama ou
escondidos entre minhas roupas, mas sim nas ruas, caminhando, conversando, julgando, principalmente. E seus
sorrisos, seus olhares, seus cochichos são mais que suficientes para fazer
temer o escuro de suas almas empobrecidas. Tenho
medo. Não da ausência de luz, pois amo as estrelas. Temo o negro, o breu, a
penumbra que algumas pessoas carregam em seus corações revertidos de boas condolências.
Faça-me
sentir suficiente!
Desligue o celular. Apague as luzes de
sua casa, ou as acenda. Tome um banho. Roube uma flor na casa vizinha. Ande,
ande como se necessitasse salvar uma vida, e talvez precise. Não, você não
precisa bater. Você nunca precisou bater
para entrar. As portas estão abertas, embora o coração machucado. Eu posso
te mandar embora e te dizer que estou bem. Eu minto, minto por não acreditar em
mais ninguém. Portanto, ainda que isso aconteça, fique. Mostre que sou suficiente, que sou escolha, a primeira opção de um sábado
cheio de outros (e mais atrativos) compromissos. Fique. Vamos ver um filme,
rir de alguma piada boba, comer pipoca. Eu te faço chocolate. Só me faça, por
favor, sentir que sou fundamental em alguma coisa. Me faça acreditar antes que eu
desligue para sempre.
Você
consegue?
Comentários
Postar um comentário