Monológo



Espreguiçou-se. A escuridão que surgia a sua volta já era de um tom conhecido, caloroso. Estava habituada aos lençóis frios e a sensação apaziguadora que a solidão lhe proporcionava. Nada de novo a aguardara. Nenhum ruído descomum. As mesmas pessoas seriam vistas ao abrir a porta, os mesmos sons, a mesma rotina asfixiante.
Desejava voltar, fechar os olhos e mais uma vez encontrar seu lugar num um mundo onde pessoas surgiam com um intuito de permanecer, onde não havia uma despedida definitiva e ela poderia ser um alguém melhor, mais digno. Mas o sol estava surgindo com sua calmaria diária, e era preciso deixar o mundo nas sombras, apaziguado em seus desejos.
Levantou-se calma e silenciosa. Vestiu-se. Roupas pretas, cabelo preso, cara limpa. Os pensamentos ressurgiam como filmes de um suspense premeditado. Fugir. Outro lugar, novos seres. Outro mundo.
Nada de uma rotina já escrita, queria uma vida nova. Desejava abrir as comportas do seus sonhos, deixa-los criar asas e voar levando-a junto. Ser uma mulher digna de sentir, afastar o medo das despedidas, dos amores quebrados, das decepções. Não. Definitivamente não aguentava mais as diversas e fustradas tentativas de relacionamentos. Quantos cortes seriam feitos até ela compreender enfim que o amor era instrumento de pessoas fortes, e ela era um ser frágil à conviver com lobos? É necessário reinventar-se.
Um mundo novo, este sem dúvida era seu desejo.
Mas ela continuava. Passos calmos, vida triste. De negro, vestida como a noite que acalentava seus devaneios. Rosto limpo. Nada de lágrimas. Não, não havia mais lágrimas. Não havia mais sorrisos. Passos, tropeços. Lenta e passiva. Calma em seus passos de aceitação. De negro a caminhar em busca de um mundo novo. Em busca de si.
- Sete pães, por favor!

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